Quando foram publicados os trabalhos na NATURE em 2012 e 2013 mostrando que a composição da microbiota intestinal podia contribuir para a obesidade houve grande estardalhaço, pensamos que tínhamos descoberto a pólvora!
Ledo engano, estamos apenas num longo e tortuoso caminho para confrontarmos essa ligação (microbiota x obesidade) que certamente existe.
Algumas afirmações devem ser bem medidas, por exemplo, vários artigos publicados explicam que a predominância de FIRMICUTES é compatível com obesidade, em relação ao filo BACTERIODETES. Porém, dentro do filo FIRMICUTES temos classes bem distintas - Bacilli (Lactobacillales) e CLOSTRIDIUM. Ora, esta última encerra microrganismos com características biológicas completamente diferentes, a começar por serem anaeróbios!
Por outro lado, quase todos os membros da classe clostridium são produtores de toxinas bacterianas perigosas, algumas fatais (C. tetanum, C. botulinum).
Assim, dizer que a predominância de FIRMICUTES é compatível com obesidade equivale, mais ou menos, a dizer que a torcida do Vasco é compatível com a torcida do Flamengo. Ou seja, não tem nada a ver.
Os firmicutes LACTOBACILLOS tem ampla bibliografia médica que demonstra suas importantes propriedades na proteção da flora, no controle de doenças inflamatórias, na melhoria da imunidade e por aí vai. Não há provas científicas de que seu aumento na flora intestinal estimule obesidade, muito pelo contrário. Estudos realizados com L. reuteri e L. gasseri mostram o grande potencial desses probióticos em equilibrar a flora e reduzir a obesidade, como nos estudos em animais e humanos.
Por outro lado, os firmicutes CLOSTRIDIUM estão implicados em diversos processos nocivos ao organismo, além de graves situações como tétano e botulismo. Muitos outros membros menos agressivos dessa família são desestabilizadores da homeostase, como C. difficile e C. perfringens.
Finalmente um artigo publicado na especializada revista BENEFICIAL MICROBES (link abaixo) melhorou o entendimento dessa relação de firmicutes com obesidade. Num detalhado estudos Remely & cols mostraram que, nos 33 pacientes obesos estudados, a redução do peso (por dieta) foi acompanhada de progressiva REDUÇÃO da presença do gênero CLOSTRIDIUM, mais especificamente de C. ruminococcus.
Talvez o melhor seria dizer que essa relação de firmicutes com obesidade é, na verdade, uma relação de CLOSTRIDIUM com obesidade. Há outros Clostridium envolvidos em patologias complicadíssimas, como por exemplo C. difficile com o desenvolvimento de AUTISMO. Quem ainda não assistiu, por favor assista o filme 'O ENIGMA DO AUTISMO" (Philos TV), pela BBC. Nesse documentário simplesmente imperdível uma abnegada mãe, que tinha por hábito filmar seu bebê desde o nascimento, é surpreendida com brutal mudança de comportamento da criança após um extenso tratamento com antibioticoterapia para curar um renitente infecção no ouvido.
Como ela filmava tudo, ficou totalmente documentado a mudança na criança, que antes do tratamento mostrava comportamento normal. Sua luta para mostrar aos médicos que alterações graves na flora intestinal poderiam, também, afetar o cérebro foi dura, enquanto ela visitava diversos centros de pesquisa sobre a microbiota. Finalmente, cientistas ingleses e dinamarqueses deram eco às suspeitas dessa mãe pseudo-cientista, pois estavam já trabalhando nessa linha.
As pesquisas subsequentes mostraram que certos antibióticos podem eliminar diversas bactérias, e também espécies LACTOBACILLALES, mas não CLOSTRIDIUM!!! Bingo, C. difficile sob acusação grave de produzir autismo pela entrega na circulação de neurotoxinas capazes de afetar os micronúcleos de neurônios nas áreas da comunicação. Mas sua proliferação desordenada decorre da morte de seus competidores, os Lactobacilos mortos pelos antibióticos...
Depois disso, outros estudos mostraram que nossa microbiota intestinal é quase uma impressão digital consolidada por volta dos 3 anos de idade. Após essa fase, é muito difícil alterá-la. O menino do filme tinha menos de 3 anos quando recebeu a antibioticoterapia mista (foram mais de 3 tipos de antibióticos por mais de 2 meses).
Após a consolidação da microbiota intestinal (aos 3 anos) realmente é muito difícil mudá-la, tanto que estão tentando transplante de flora, ainda sem sucesso.
Por esse motivo, também, a administração dos probióticos tem de ser constante e não de uma única vez, não podemos mais alterá-la definitivamente, mas somente melhorá-la temporariamente. Outra coisa importante que já é um consenso: dieta pode mudar a flora! A substituição de excesso de carne e embutidos por vegetais e frutas favorece a diminuição dos CLOSTRIDIUM.
Bom, ainda teremos muito a dizer sobre esse tema, especialmente sobre as BACTERIODETES, filo que encerra Bacillus tethaiotaomicron e Prevotella, também implicados com aumento de peso. As pesquisas estão fervilhando nessa área. Certamente antes do que se espera teremos novidades para trazer a vocês.
O link para o artigo:
Aqueles que quiserem o artigo completo (acima é o abstract) favor pedir por e-mail.
ATENÇÃO: próxima reunião científica do GRUPO DE ESTUDOS HELION PÓVOA (GEHP) será em 03 de março de 2016. Mandarei por e-mail os detalhes. Leitores que não estejam cadastrados e queiram participar das reuniões peço que mandem seu e-mail para:
O TEMA SERÁ: ATUALIZAÇÃO EM BIOFLAVONÓIDES - novas possibilidades na medicina.
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